“Do outro lado do planeta, num longínquo recanto da Amazónia,
junto da fronteira entre a Bolívia e o Brasil, surge a mesma promessa ao longo
da rua. Em plena floresta virgem, o grupo industrial de construção Mendes
Júnior, de São Paulo, faz publicidade em grandes painéis a vivendas individuais
inspiradas no modelo norte-americano, idílicas, requintadas e grandes
consumidoras de recursos naturais. Em sórdidas cabanas, à beira das águas
turvas do rio Purus, jovens caboclos, os mestiços descendentes dos Índios e dos
escravos negros, discutem as medidas da nadadora Pamela Anderson, da série televisiva
californiana Baywatch, como se se
tratasse da filha do vizinho. Ajudados por leitores de vídeo e cassetes provenientes
de Hollywood, os negociantes de madeira corrompem a poucas tribos índias que
ainda sobrevivem no estado de Rondônia, a fim de que estas os autorizem a
abater os últimos cajus das suas reservas. […]
Não tenhamos dúvidas: se a humanidade tivesse hoje de votar
para escolher um estilo de vida mundial, poderia efetivamente fazê-lo. Atualmente,
mais de quinhentos satélites ativos emitem para a Terra os sinais
radiodifundidos da modernidade. Imagens uniformes, em mil milhões de ecrãs de
televisão, alimentam os mesmos desejos nas margens do Amur, do Yangtze, do
Amazonas, do Ganges e do Nilo. Mesmo nas regiões privadas de qualquer corrente
elétrica (por exemplo, o Níger, na África Ocidental), as parabólicas e os
painéis solares transportam milhões de pessoas «para fora da sua existência aldeã
e para uma dimensão planetária», para usar a expressão do secretário-geral do
Clube de Roma, Bertrand Schneider. […]
Nunca como agora as pessoas souberam tanto e estiveram tão
informadas sobre o resto do mundo. Pela primeira vez na sua história, a
humanidade está unida por uma imaginação comum.”
Hans-Peter Martin e Harald Schumann, A Armadilha da Globalização, Lisboa, Terramar, 1998, pp. 19-21